Vítimas de Brumadinho têm direito de agir contra seguradora, diz especialista
A Vale está em silêncio sobre seu seguro de responsabilidade civil desde o rompimento da barragem de Brumadinho (MG), no dia 25 de janeiro. A empresa vem se limitando a dizer que tem seguro e que os prejuízos causados pelo rompimento estão cobertos. Mas pouca gente sabe mais que isso, porque o contrato está sob sigilo desde o dia seguinte ao desastre.
Segundo o artigo 787 do Código Civil, o seguro de responsabilidade civil é uma garantia para pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiros. Para o advogado Ernesto Tzirulnik, presidente do Instituto Brasileiro de Direito do Seguro (IBDS), ocultar essas informações restringe o acesso às vítimas que poderiam agir diretamente com a seguradora sem a necessidade de intervenção do segurado.
Tzirulnik ressalta que já está sumulado no Supremo Tribunal de Justiça o entendimento de que a vítima tem direito de agir diretamente contra a seguradora, uma vez que existe interesse do terceiro na apólice. “Estamos falando do exercício de uma atividade de risco que é caso de responsabilidade objetiva”, diz. “A vítima, a rigor, não precisaria nem acionar a Vale, e sim diretamente a seguradora. Mas como poderia propor ação se não tem acesso ao contrato do seguro?”
Questionada, a assessoria de imprensa da mineradora se restringiu a dizer que “a Vale possui seguros que cobrem os danos causados aos seus empregados funcionários, aos seus bens e a terceiros”. A empresa não explicou por que pediu para que o contrato ficasse em sigilo.
Segundo o jornal Valor Econômico, o contrato do seguro de responsabilidade civil da Vale é com a Allianz, mas a seguradora só disse à ConJur que não comentará o caso.
De acordo com Tzirulnik, esse tipo de seguro pode cobrir também os acionistas não controladores. Para o especialista, eles são potenciais vítimas assim como os que sofreram danos materiais, como fazendeiros e comerciantes. “Existe até mesmo a possibilidade de existir um seguro de responsabilidade civil dos administradores, garantindo a própria sociedade em que trabalham”, afirma.
Possível conflito
O presidente do IBDS destacou que pode existir um conflito de interesses caso a mineradora Vale tenha contratado a mesma seguradora, controladora ou advogado para os seguros de responsabilidade civil e o de responsabilidade dos dirigentes da empresa, conhecido como D&O, Directors and Officers Liability Insurance, em inglês.
“Os segurados administradores esmagados pelas acusações criminais vão ‘abrir o coração’ nas regulações dos sinistros de D&O e as seguradoras poderão utilizar esse fogo para construir negativa das apólices de RC Geral alegando o dolo ou a culpa grave da Vale”, explicou Tzirulnik.
Proposta de indenização
Na sexta-feira (8/2), a Vale apresentou ao Ministério Público do Trabalho de Minas Gerais propostas de indenização aos parentes dos trabalhadores próprios e terceirizados que foram vítimas no rompimento da barragem.
A mineradora ofereceu o pagamento de R$ 300 mil a título de danos morais para o cônjuge ou companheiro e companheira de cada vítima. O mesmo foi oferecido a cada filho. Pai e mãe receberiam R$ 150 mil cada um, enquanto cada irmão seria indenizado em R$ 75 mil.
O pagamento de danos materiais propostos pela mineradora seriam correspondentes a dois terços de um salário mensal líquido até a data em que o trabalhador completaria 75 anos.
Texto: Mariana Oliveira
Fonte: Portal ConJur
Foto: Ricardo Stuckert